segunda-feira, janeiro 31, 2005

(...)

a rua continua nua
(eu na luz da sua lua)
a rua continua nossa

sexta-feira, janeiro 21, 2005

insônia

eu confuso
o silêncio é uma voz abafada no escuro
eu oscilo
entre o aqui e o não
ruídos da luz que não me entra por frestas
resta-me a dúvida

arranco fios
noite-em-claros
foi-se aos berros a certeza
eu paradoxo
eterno desencontro de retas
eu alguém
que não conheço
eu esqueço

rota incerta de sede eterna
costas nuas, abertas ao acaso
díspare fera: o hiato
fere e profere a verdade do fato
o septo do alvo
disparo e parada
“fira e confira a ferida”
coágulo ávido a cicatrizar
a dor que não cessa
o óleo escancara

um gole de água já não entorpece as dores
e os vazios
inconstante por natureza
múltiplo por formação
eu

sábado, janeiro 15, 2005

Do imenso peso

A palavra é obstáculo.
O que realmente é, ou não é, é por demais intangível por nossa vã filosofia, calcada em linguagem que é. E o que é, pois, a verdade, que não vaga convenção aceita letargicamente por legiões narcotizadas pelo cotidiano? A razão e a lógica são amarras que nos impedem de alçar vôos mais ousados rumo ao cerne do ser. A verdade não se atinge pela palavra. A verdade não existe na palavra.
Que é então a poesia, que não al(im)ento do poeta? Exercício de vaidade que reitera com ironia e petulância a consciência de sua incapacidade, de sua incompetência.
A arte habita o além-discursivo, o além-sensorial: habita o além. Não almeja, pois, exprimir o inexprimível; o é, e assim se tem por fim.
A palavra é o obstáculo.

quinta-feira, janeiro 06, 2005

o jardim

Em seu tarde-ser, nem toda árvore floria. Umas, regadas de mácula, quedavam em eterno outono; outras, por cursos indevidos d´água ou história, pereciam mudas no correr do tempo.
E o tempo se fechava seco, dizendo “não” ao jardim. Faltavam saídas, sobravam pontas.
O jardineiro a chorar seus fracassos em silêncio. Arde-lhe por dentro um amargor tênue, contínuo, emudecedor, não diluível em gestos lentos.
O cenário se compadecia; imóvel, emitia um feixe de angústia que cortava os olhos dos que por ali passavam.

segunda-feira, janeiro 03, 2005

Pareço ter, inconscientemente, buscado o isolamento.
Tendo a sentir-me estranhamente aconchegado nesse estado, recorrente, então. Há um silêncio caudaloso, de todas as ausências, inicia-se um extenso e difuso monólogo, vez por outra o ar estremece no som disforme de um verbo solto. O silêncio a transformar as dimensões do ruído, e tudo se põe a gritar, exagerar-se propositalmente. A quietude emite sombras, elas seguem, a se entrelaçar em sons distantes, à noite, ao torpor. Chego, e o vocabulário intenta atravessar o tempo das fagulhas.

- A inércia é a metáfora da eternidade.